terça-feira, 26 de março de 2013

MINHA CASA MINHA VIDA. CASA INUNDADA

Minha Casa, Minha Vida: moradores beneficiados por programa sofrem com rachaduras e inundações

  • Fragilidade de parte dessas construções ficou evidente semana passada, com os problemas nos prédios que receberiam desabrigados da tragédia do Morro do Bumba
Rafael Galdo (Email · Facebook · Twitter)
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Casa nova. Moradora mostra rachadura no condomínio Santa Lúcia, em Santa Cruz da Serra, Duque de Caxias, construído dentro do programa habitacional Minha Casa Minha Vida
Foto: Eduardo Naddar / O Globo
Casa nova. Moradora mostra rachadura no condomínio Santa Lúcia, em Santa Cruz da Serra, Duque de Caxias, construído dentro do programa habitacional Minha Casa Minha VidaEduardo Naddar / O Globo
RIO — Para quem vivia em áreas de risco, muitas vezes em barracos precários, ganhar apartamentos em conjuntos habitacionais com espaços de lazer e saneamento adequado poderia parecer solução, não fossem alguns desses condomínios verdadeiros castelos de areia, como relatam moradores de unidades do programa Minha Casa Minha Vida. A fragilidade de parte dessas construções ficou evidente semana passada, com os problemas nos prédios que receberiam desabrigados da tragédia do Morro do Bumba, em Niterói.
Nos condomínios Santa Helena e Santa Lúcia, no Parque Paulista, em Duque de Caxias, as 389 casas foram inundadas semana passada, fazendo com que muitos moradores perdessem tudo. Na segunda-feira, oito dias depois das chuvas, as pessoas continuavam limpando os estragos. Em frente aos conjuntos, havia montes de móveis que tiveram de ser jogados no lixo.
— Passei minha vida pedindo a Deus uma casa. Quando finalmente recebi, comprei todos os móveis novos. Mas veio a água e destruiu tudo — conta, chorando, a dona de casa Francisca Rabelo Gonzaga, de 52 anos. — Pior que, já tendo morado em vários bairros, alguns lugares de risco, nunca tinha passado por isso — acrescentou Francisca, que paga pela casa R$ 54 mensais à Caixa Econômica Federal, que financiou o projeto.
Os problemas, no entanto, não começaram com o temporal da semana passada. Muitas casas têm rachaduras e infiltrações, como a da doméstica Ana de Souza Silva, de 49 anos.
— Já construí uma barreira com tijolo e cimento nas minhas portas. Mas não adianta. A água passa por cima. Não sei mais o que fazer. A casa está toda rachada e mofada — diz Sidneia Fonseca da Silva.
Já em Santa Cruz, na Zona Oeste do Rio, só em maio completa um ano que os moradores, reassentados de comunidades como Pedreira e Cidade de Deus, começaram a ocupar as 2.718 unidades em oito condomínios da Estrada dos Palmares. Conjuntos tão novos, contudo, já repletos de problemas estruturais. No Almada, uma fileira de postes tortos, inclinados no pátio onde as crianças brincam, assusta. E são muitos outros riscos. Valéria de Jesus Santos, ex-moradora de Costa Barros, mostra que estruturas de metal, como corrimãos, já estão enferrujadas e se soltando. Muitos apartamentos também enfrentam problemas de infiltração.
— Morava num barraco de madeira e não chovia tanto dentro de casa quanto aqui — afirma Valéria.
Condomínio cheio de remendos
Em Realengo, nos condomínios Ipê Branco e Amarelo, que receberam reassentados de obras em Madureira e Turiaçu, o solo irregular já denuncia que há algo de errado no terreno. Síndico do Ipê Branco (com 299 unidades), José Rodrigues Carneiro conta que os conjuntos foram entregues há quase três anos. Desde então, já apareceram rachaduras e fissuras em todos os blocos, dentro e fora dos apartamentos. Segundo moradores, são incontáveis os remendos que a construtora Patrimar realizou para tentar contornar as fissuras. Mas elas continuam aparecendo.
— Temos muito medo, porque não sabemos se estamos numa moradia segura. Entre os blocos, a drenagem é falha. Quando chove, a água empoça, entra nas casas e desce o terreno, carreando muito barro. Por causa da erosão, há tubulações de gás aparentes — diz José.
Rachaduras, além de alagamentos, também são o drama com qual convivem moradores do Bairro Carioca, em Triagem, Zona Norte do Rio, projeto da prefeitura executado com recursos do Minha Casa Minha Vida. Nas chuvas do início deste mês, a água chegou à altura dos joelhos em apartamentos do térreo, muitos deles de cadeirantes. No total, ali serão 2.240 apartamentos, 640 deles entregues até janeiro passado.
Para especialistas, problemas na qualidade das obras em programas habitacionais se repetem em todo o país. Sobre o Minha Casa Minha Vida, Adauto Lucio Cardoso, do Observatório das Metrópoles do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional (Ippur/UFRJ), cita uma série de fatores que contribuem para a má qualidade construtiva, principalmente nos empreendimentos destinados à população de baixa renda. Segundo ele, não existe uma estrutura clara de fiscalização das obras, já que a Caixa Econômica Federal, responsável pelo financiamento do programa, ocupa-se mais de acompanhar os cronogramas físico-financeiros das construções, enquanto as prefeituras não estariam preparadas para identificar os problemas. Ainda de acordo com ele, o controle de qualidade fica a cargo da própria construtora.
Além disso, diz ele, com o encarecimento do preço dos terrenos no Rio, desde 2005, as empresas muitas vezes têm buscado economizar em outros itens, para conseguir manter a margem de lucro. E mesmo quando as construtoras conseguem áreas mais baratas, em vários casos não realizam as intervenções que os terrenos exigiriam.
— Ao longo da Avenida Brasil, por exemplo, são vários condomínios abaixo do nível da via. Esses terrenos precisariam de estruturas de drenagem maiores. Mas elas acabam não sendo feitas. As áreas inundam, o que pode vir a prejudicar as fundações e comprometer o solo — afirma Adauto, que conduz uma pesquisa sobre o programa do governo federal.
Na cidade do Rio, a Secretaria municipal de Habitação afirma que mantém equipes de fiscalização e manutenção, além de plantão de assistentes sociais, nos empreendimentos do Minha Casa Minha Vida. E diz que, sempre que identifica problemas ou é acionada pelos moradores, verifica as causas e, caso constate “vício construtivo”, notifica a Caixa e as construtoras, para que tomem as providências necessárias.
Já a Caixa Econômica garantiu que os empreendimentos Bairro Carioca, Santa Helena e Santa Lúcia foram construídos fora da faixa de alagamento, atendendo a todas as normas de segurança. No caso de Triagem, a instituição afirma que a prefeitura já iniciou obras de drenagem, canalização e desassoreamento do Canal do Cunha, próximo ao terreno. Em Caxias, a área de engenharia da Caixa, junto com o município, iniciou trabalhos técnicos na região para identificar as causas do alagamento e evitar futuras inundações.
Além disso, foram tomadas outras medidas, como a instalação de uma agência móvel do banco próximo aos condomínios, a suspensão do pagamento das prestações do financiamento imobiliário até que sejam restabelecidas as condições de moradia e contratação de uma empresa para realizar os serviços de recuperação dos imóveis. Quanto aos prédios do Fonseca, em Niterói, que vão abrigar vítimas da tragédia do Morro do Bumba, a entidade informou que já contratou perícia técnica a fim de identificar os fatores que determinaram os problemas. O resultado deve sair em até 15 dias. Dois blocos estão sendo demolidos, e foram tomadas providências para impedir o acesso de pessoas ao local.
A instituição informou ainda que tem equipes técnicas que acompanham regularmente as obras. Com relação aos empreendimentos de Santa Cruz e Realengo, a Caixa disse que enviará equipes ao local para fazer vistorias.
Só na cidade do Rio, segundo dados da Secretaria municipal de Habitação, já foram entregues 30.199 unidades pelo Minha Casa Minha Vida até o fim de 2012. Em todo o estado, informou o Ministério das Cidades, já foram entregues 41.622 unidades do programa.


Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/rio/minha-casa-minha-vida-moradores-beneficiados-por-programa-sofrem-com-rachaduras-inundacoes-7944598#ixzz2OebD8XNd
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