Ministra Eliana Calmon, a ministra sem papas na língua:
trajetória e frases marcantes em dois anos como corregedora do Conselho Nacional
de Justiça (Foto: Dedoc / Editora Abril)
Amigas e amigos do blog, as condenações que o Supremo Tribunal Federal vem
impondo à quadrilha que comandou e fez operar o escândalo do mensalão fazem
surgir no horizonte a perspectiva de que, enfim, figurões da política e do poder
possam pagar por seus crimes.
É uma boa hora, então, para relembrar a recente trajetória da ministra do
Superior Triubnal de Justiça Eliana Calmon como corregedora do Conselho Nacional
de Justiça, cargo cuja função era fiscalizar e propor punições a juízes e
tribunais que saíssem da linha.
Ela deixou o posto em setembro, após dois anos de trabalho, de mais de uma
centena de juízes punidos e de uma franqueza que teve dois resultados: provocou
críticas e boicotes por parte de colegas magistrados, e um grande aplauso da
sociedade à “ministra sem papas na língua”.
Criadora, entre outras expressões, da fortíssima “bandidos de toga” para se
referir a juízes corruptos, o blog homenageia a ministra — cuja atuação como que
antecipou o que agora ocorre com os mensaleiros no Supremo — relembrando algumas
de suas declarações marcantes e corajosas:
MENSALÃO – ”O Supremo está dizendo que a corrupção, que
durante dois séculos reinou neste país, a partir de agora tem um freio, e esse
freio está no Poder Judiciário. Não haverá mais tolerância com a corrupção. Não
tenho dúvida de que isso já está provocando mudanças nos planos de certos
bandidos, inclusive os de toga”. — VEJA, em 10 setembro de 2012
BANDIDOS DE TOGA – “Acho que [
a atuação disciplinar do
Conselho Nacional de Justiça] é o primeiro caminho para a impunidade da
magistratura, que hoje está com gravíssimos problemas de infiltração de bandidos
que estão escondidos atrás da toga” — Entrevista à Associação Paulista de
Jornais (APJ), em 27 de setembro de 2011
JUIZ NÃO TEM AMIGOS – ”Eu só sou magistrada, não tenho
aptidão para a política. Sou uma pessoa que fala as coisas, não faço favores. Os
meus amigos dizem ‘Eliana não faz favores, não é amiga dos amigos’. Eu sou
amiga, mas dentro da minha atividade profissional eu não tenho amigo, não faço
favor porque é uma questão de princípio. No dia em que fizer um favor, eu
faço dez”. —
Estadão,em 13 de agosto de 2012
MAGISTRATURA SÉRIA X VAGABUNDOS INFILTRADOS – “Precisamos
abrir diversos flancos para falar o que está errado dentro da nossa casa. Faço
isso em prol da magistratura séria, decente e que não pode ser confundida com
meia dúzia de vagabundos que estão infiltrados na magistratura” — Audiência na
Comissão de Constituição e Justiça do Senado, em 28 de fevereiro de 2012
[JUIZ] CORRUPTO NÃO DEIXA DOCUMENTO – “É muito difícil
[magistrado] corrupto deixar documento. Vou me valendo das provas que estão em
inquérito ou que estão no Superior Tribunal de Justiça. Essas investigações
patrimoniais são importantes porque através do imposto de renda e também desse
compartilhamento de quebra de sigilo eu posso fazer alguma coisa” – Audiência na
Comissão de Constituição e Justiça do Senado, em 28 de fevereiro de 2012
TRUQUES QUE AUMENTAM SALÁRIOS – “Estamos encontrando o
seguinte: desembargadores ganham o teto, 26 mil reais, mas durante três meses do
ano vem um penduricalho onde se dá uma gratificação monstruosa. Se somarmos tudo
e dividirmos por 12, eles não ganham 26 (mil), ganham 50, 40 (mil)”. – Audiência
na Comissão de Constituição e Justiça do Senado, em 28 de fevereiro de 2012
MARACUTAIAS NOS PRECATÓRIOS – “O precatório [
título de
dívida dos governos para com pessoas e empresas] está todo desorganizado e,
muitas vezes, a desordem é para encobrir o malfeito” –
Agência
Brasil (entrevista coletiva), em 13 de fevereiro de 2012
CORPORATIVISMO E ELITISMO – “Estamos removendo 400 anos de
representação elitista dentro do Judiciário (…) A modernidade vai tomando conta
dos espaços públicos e deixando engessados os movimentos corporativistas”
–
Estadão, em 7 de fevereiro de 2012
A ministra, segundo a qual o Judiciário vive
"gravíssimos problemas de infiltração de bandidos que estão escondidos atrás da
toga" (Foto: GF fotografias)
SÍMBOLO – “Acabei simbolizando um movimento de abertura do
Judiciário” —
Estadão, em 7 de fevereiro de 2012
OS PODERES DO CNJ – “Eu me emocionei a cada voto, contra ou
a favor, fiquei muito emocionada. Ao final, quando tudo terminou, falaram ‘O que
você vai fazer?’. Eu disse ‘Eu vou dormir, porque não durmo há três
meses’” –
Agência Brasil (entrevista coletiva), em 3 de fevereiro de
2012 (sobre conflito judicial sobre as competências do CNJ, julgado
favoravelmente ao Conselho pelo Supremo Tribunal Federal)
ASSOCIAÇÕES DE MAGISTRADOS MENTIRAM – “Só posso lamentar
[
a polêmica], fruto de maledicência e irresponsabilidade da AMB
[
Associação dos Magistrados Brasileiros], Ajufe [
Associação dos
Juízes Federais do Brasil] e Anamatra [
Associação Nacional dos
Magistrados da Justiça do Trabalho], que mentirosamente desinformam a
população ou informam com declarações incendiárias e inverossímeis”, pretendendo
fazer um “linchamento moral” – Declarações feitas num debate no auditório da
Folha de S.Paulo, em 21 de novembro de 2011 (a ministra rebatia
informações de associações de magistrados segundo as quais o Conselho Nacional
de Justiça havia quebrado os sigilos bancários e fiscais de juízes e levaria a
cabo uma investigação sobre 270 mil pessoas. Segundo ela, havia já quatro anos
que a corregedoria do CNJ realizava investigações sobre patrimônio de
juízes, com base em suas declarações de imposto de renda, atividade prevista na
legislação)
COLARINHO BRANCO – “O senhor conhece algum colarinho branco
preso?” –
Roda Viva, TV Cultura, em 14 de novembro de 2011
“Eu não posso resolver todos os problemas do Judiciário…, mas eu me
posiciono” –
Roda Viva, TV Cultura em 14 de novembro de 2011
BANDIDOS INFILTRADOS – “Eu não tenho que me desculpar. Estão
dizendo que ofendi a magistratura, que ofendi todos os juízes do país. Eu não
fiz isso de maneira nenhuma. Eu quero é proteger a magistratura dos bandidos
infiltrados” — Coluna de Mônica Bergamo,
Folha de S.Paulo, em 28 de
setembro de 2011
"Os bandidos (na Justiça) são minoria, uma coisa
mínima, de 1%, mas fazem um estrago absurdo" (Foto: Agência Brasil)
MINORIA QUE FAZ UM GRANDE ESTRAGO — “A quase totalidade dos
16 mil juízes do país é honesta, os bandidos são minoria. Uma coisa mínima, de
1%, mas que fazem um estrago absurdo no Judiciário” – Coluna de Mônica
Bergamo,
Folha de S.Paulo, em 28 de setembro de 2011
COMPLÔ PARA NÃO PUNIR – “As portas estão se fechando. Parece
haver um complô para que não se puna ninguém no Brasil” – Coluna de Mônica
Bergamo,
Folha de S.Paulo, em 28 de setembro de 2011
A DIFICULDADE DE INSPECIONAR O TJ DE SÃO PAULO – “Sabe que
dia eu vou inspecionar São Paulo? No dia em que o sargento Garcia prender o
Zorro. É um Tribunal de Justiça fechado, refratário a qualquer ação do CNJ e o
presidente do Supremo Tribunal Federal é paulista” — Entrevista à Associação
Paulista de Jornais (APJ), em 27 de setembro de 2011
OS PIORES MAGISTRADOS ACABAM CHEGANDO AO TOPO – ‘Hoje é a
política que define o preenchimento de vagas nos tribunais superiores, por
exemplo. Os piores magistrados terminam sendo os mais louvados. O ignorante, o
despreparado, não cria problema com ninguém porque sabe que num embate ele
levará a pior. Esse chegará ao topo do Judiciário” — VEJA, em setembro de
2010
NOS TRIBUNAIS SUPERIORES, SÓ CRITÉRIO POLÍTICO – “Para
ascender na carreira, o juiz precisa dos políticos. Nos tribunais superiores, o
critério é única e exclusivamente político” – VEJA, em setembro de 2010
FRUTO DE UM SISTEMA – “Certa vez me perguntaram se eu tinha
padrinhos políticos. Eu disse: ‘Claro, se não tivesse, não estaria aqui’. Eu sou
fruto de um sistema. Para entrar num tribunal como o STJ, seu nome tem de
primeiro passar pelo crivo dos ministros, depois do presidente da República e
ainda do Senado. O ministro escolhido sai devendo a todo mundo”– VEJA, em
setembro de 2010
"Nós, magistrados, temos a tendência a ficar
prepotentes e vaidosos. Isso faz com que o juiz se ache um super-homem (...).
Precisamos ter cuidado para ter práticas de humildade dentro do Judiciário"
(Foto: Valter Campanato / ABr)
AUTO-DEFINIÇÃO COMO “REBELDE” – “Eu não sou a única rebelde
nesse sistema, mas sou uma rebelde que fala”– VEJA, em setembro de 2010
JUIZ NÃO PODE SER PREPOTENTE NEM VAIDOSO – “Nós,
magistrados, temos tendência a ficar prepotentes e vaidosos. Isso faz com que o
juiz se ache um super-homem decidindo a vida alheia. Nossa roupa tem renda,
botão, cinturão, fivela, uma mangona, uma camisa por dentro com gola de ponta
virada. Não pode. Essas togas, essas vestes talares, essa prática de entrar em
fila indiana, tudo isso faz com que a gente fique cada vez mais inflado.
Precisamos ter cuidado para ter práticas de humildade dentro do Judiciário. É
preciso acabar com essa doença que é a ‘juizite’”– VEJA, em setembro de 2010
RETRATO DE JUSTIÇA CARA, LENTA E INEFICIENTE – “Pela
primeira vez [
com a criação do CNJ], foram feitos diagnósticos oficiais
do funcionamento da prestação jurisdicional, dos serviços cartorários. Pela
primeira vez, veio a conhecimento de todos, até dos próprios protagonistas da
função judicante, o resultado de uma justiça cara, confusa, lenta e ineficiente”
— Discurso de posse como ministra do CNJ, em 8 de setembro de 2010
OS VILÕES DO PODER – “Não está sendo fácil corrigir os
rumos, implantar práticas administrativas modernas, desalojar os vilões do Poder
e, principalmente, mudar os usos e costumes de um Judiciário desenvolvido à
sombra de uma sociedade elitista, patrimonialista, desigual e individualista”. –
Discurso de posse como ministra do CNJ, em 8 de setembro de 2010
AVISO PRÉVIO – “Terei tolerância zero” – Discurso de posse
como ministra do CNJ, em 8 de setembro de 2010